“Mark, um homem de negócios dos EUA, estava passando por muitas dificuldades financeiras na sua empresa. Parecia que nada mais dava certo: as vendas pararam, os fornecedores dificultavam cada vez mais as condições de pagamento e os funcionários, cansados dos atrasos salariais, começaram a pedir demissão um após o outro. Parecia que a empresa de Mark estava realmente fadada à falência. Certa manhã, em depressão e precisando espairecer um pouco, Mark foi dar uma volta no Central Park. Depois de caminhar um pouco, sentou-se em um dos bancos do parque, ao lado de um senhor de idade. Eles começaram a conversar e Mark acabou desabafando sobre a situação da sua empresa, contando sobre as dificuldades e o provável encerramento das atividades. Depois de ouvir aquele desabafo, o senhor tirou um talão de cheques da carteira, arrancou uma folha, escreveu algo e entregou a Mark. Quando ele olhou para o cheque, quase desmaiou: eram U$ 500.000! O senhor disse para Mark:
– É um empréstimo, para te ajudar a reerguer sua empresa. Eu confio em você. Você pode me devolver este dinheiro dentro de um ano, sem pressão. Sua empresa vai ficar bem, não se preocupe.
Mark não sabia nem como agradecer. Foi quando prestou atenção à assinatura do cheque. Aquele homem era Warren Buffett, um dos maiores milionários dos EUA. Parecia que a Providência Divina o havia colocado justamente ao lado daquele homem, e no momento em que ele mais precisava!
Mark sentiu seu espírito se renovando. A depressão desapareceu, e no lugar veio uma incrível vontade de lutar. Ao invés de depositar o cheque no banco, Mark foi para casa e guardou o cheque em um cofre. Recomeçou o trabalho na empresa com as forças renovadas, pois sentia que havia um leão dentro dele. Contratou uma nova equipe, trabalhou até de madrugada e se esforçou no limite. Após um ano a empresa já havia se recuperado, sem a necessidade de usar aquele cheque. Mark havia descoberto um novo potencial dentro de si.
Quando chegou o dia do pagamento, Mark foi ao parque devolver o cheque. Ele viu de longe o senhor que havia emprestado o dinheiro e caminhou em sua direção. Abraçou aquele senhor e devolveu o cheque, explicando que não havia sido necessário utilizá-lo. Enquanto conversavam, uma enfermeira aproximou-se e perguntou a Mark se aquele senhor o estava importunando. Mark, com um enorme sorriso, disse que aquele senhor o havia ajudado muito na vida. A enfermeira então cochichou no ouvido de Mark:
– Tome cuidado com este senhor. Ele vive em uma casa de repouso há anos, desde que perdeu a esposa. O pior é que, de alguns anos para cá, ele tem vivido em um mundo de fantasia. Ele finge que é Warren Buffet, diz isto para todos que encontra e chega até mesmo a se vestir como ele. Mas ele não tem nem onde cair morto…”
O maior presente que D'us nos dá não é quando Ele nos manda pronto o que precisamos, e sim quando Ele nos dá a oportunidade de descobrir as forças que temos dentro de nós mesmos.
Nesta semana lemos a Parashat Emor (que literalmente significa “Diga”). Entre outros assuntos, a Parashat fala sobre a santidade dos Cohanim (sacerdotes), e ressalta que o Cohen Gadol (Sumo Sacerdote) deveria ser uma pessoa ainda mais elevada. De acordo com o Talmud (Yoma 18a), o Cohen Gadol deveria ser superior aos outros Cohanim em quatro atributos: força, beleza, intelecto e dinheiro. Há um Midrash que cita versículos que comprovam a necessidade do Cohen Gadol se destacar em cada um destes quatro atributos. Por exemplo, o Midrash traz o seguinte versículo como fonte da necessidade do Cohen Gadol ser mais forte do que os outros Cohanim: “E Aharon deverá balançar os Leviim” (Bamidbar 8:11). O versículo refere-se à cerimônia de consagração dos Leviim, no qual parte do processo consistia em Aharon HaCohen levantar vinte e dois mil Leviim sobre sua cabeça em um único dia.
O Rav Chaim Shmulevitz zt”l (Lituânia, 1902 – Israel, 1979) explica que a façanha de erguer em um único dia vinte e duas mil pessoas somente pôde ocorrer com a intervenção Divina. Por mais forte que fosse Aharon, não seria possível um ser humano realizar algo assim. Porém, de acordo com esta explicação, surge um grande questionamento: se o ato de Aharon foi algo sobrenatural, que somente ocorreu com intervenção Divina, então por que este versículo foi trazido pelo Midrash como a fonte da grande força de Aharon se, na verdade, esta grande força foi consequência de um evento milagroso?
O Midrash acrescenta ainda que esta exigência de uma força superior também era um pré-requisito para os reis. Como prova disto, o Midrash cita um interessante diálogo que ocorreu entre David HaMelech e Shaul HaMelech, relatado no “Sefer Shmuel” (um dos livros do Tanach). Goliat (Golias), um guerreiro dos Pelishtim (Filisteus), havia desafiado o povo judeu a mandar seu maior guerreiro para lutar contra ele, e David se voluntariou para representar o povo judeu nesta luta. Quando Shaul perguntou a David porque ele se achava capaz de derrotar Goliat, David respondeu que quando ele era um pastor, certa vez seus rebanhos foram ameaçados por um leão e um urso. Apesar da dificuldade e do perigo da situação, David conseguiu se levantar e matar os dois animais. Mas Shaul não se convenceu com as palavras de David e argumentou que matar animais selvagens ainda não indicava que ele seria capaz de matar um guerreiro tão experiente quanto Goliat. David então explicou que, da mesma maneira que D'us o havia ajudado a matar os animais selvagens, Ele também o ajudaria a matar Goliat (Shemuel I 17:32-38).
Esta conversa de Shaul com David não é fácil de entendida. Por que David, em seu primeiro argumento, mencionou apenas o fato de ter conseguido matar os animais, ao invés de já ter dito desde o início que, da mesma forma que D'us o havia ajudado a matar os animais, Ele também o ajudaria a matar Goliat? Por que ele quis inicialmente demonstrar a sua própria força, ao invés de ressaltar que é D'us que faz tudo?
Explica o Rav Yohanan Zweig que a resposta está em um interessante ensinamento do Talmud Yerushalmi (Bikurim 3:3), que afirma que quando uma pessoa é elevada a um novo cargo, com um nível de responsabilidade maior, então é concedido a ela o perdão por suas transgressões. Mas qual é a relação entre assumir um novo cargo e o perdão? Quando uma pessoa assume um novo cargo, a posição por si só já desperta nela novos talentos e habilidades que ela não possuía anteriormente. Por causa desta transformação, ela é considerada como se fosse uma nova pessoa e, portanto, é concedido a ela o perdão por seus erros anteriores.
É justamente isto que o Midrash vem nos ensinar. As novas habilidades e talentos que a intervenção Divina desperta na pessoa é apenas uma amplificação e um aprimoramento de um potencial já pré-existente. D'us ajuda a pessoa, em uma certa área na qual ela já tem uma propensão natural, a se desenvolver ainda mais. Quando David mencionou para Shaul que ele havia matado o leão e o urso, ele estava transmitindo que D'us já havia dado a ele a habilidade natural de ser um guerreiro. E David também sabia que, quando fosse colocado em uma circunstância que exigia maiores habilidades, D'us então aprimoraria seus talentos naturais para assegurar que ele saísse vitorioso. Por isso ele ressaltou inicialmente sua própria força, isto é, sua tendência natural, e somente depois ressaltou a ajuda Divina na batalha contra Goliat.
Este conceito de crescimento e adequação às novas responsabilidades é ressaltado nas palavras finais do Midrash, que nos ensina que, apesar de Shaul ser um dos homens mais altos do povo judeu, quando ele retirou sua armadura e colocou-a sobre David, ela coube perfeitamente. A ajuda Divina que veio com as novas responsabilidades de David fez com que ele aumentasse sua estatura física, a ponto dele caber perfeitamente na armadura de Shaul.
Ao entender as palavras de David no seu diálogo com Shaul, podemos entender também porque que o Midrash cita a consagração dos Cohanim como sendo a fonte para a força física do Cohen Gadol. Embora a façanha de levantar vinte e dois mil homens em um dia somente pode ser realizada através da ajuda Divina, Aharon foi escolhido justamente por já possuir a habilidade natural da força física, que pôde ser aprimorada através da intervenção milagrosa de D'us. Se ele não tivesse esse potencial, então não teria sido o escolhido para esta função. Por isso o versículo serve como prova da força do Cohen Gadol, pois apesar de não ter a força sobre-humana de levantar milhares de pessoas, Aharon já tinha o talento natural, o suficiente para que a intervenção Divina tornasse a façanha de consagrar os Leviim algo possível.
Este ensinamento pode ser aplicado em nossas vidas. Muitas vezes temos medo de arriscar, de assumir novas responsabilidades e enfrentar novos desafios na vida. Da Parashat aprendemos que, quando queremos fazer o que é correto, D'us nos ajuda e revela novas habilidades que nem imaginávamos ter dentro de nós. Devemos sempre almejar crescer mais e alcançar novos patamares, andando sempre no caminho correto e de acordo com as nossas inclinações e aptidões naturais. Devemos fazer a nossa parte e descobrir as nossas forças, mas sem esquecer que, em última instância, quem realmente faz tudo acontecer é D'us.
SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm