Na parashat Vaishlach, lemos sobre a maravilhosa e celestial luta entre Yaakov e o anjo – o ministro de Essav. Assim está escrito na Torá (Bereshit 22:25): “E Yaakov ficou sozinho, e um homem lutou com ele até o amanhecer”. Yaakov encontrou-se sozinho em sua luta depois que sua família e filhos, sua única segurança, já haviam atravessado a passagem de maavar yabok. E ele ficou sem ajuda, somente se apoiando em D'us.
A Torá não especifica o motivo de estar sozinho.
Rashi cita as palavras do Talmud (Chulin 32b) a razão de seu retorno: “Esqueceu pequenos jarros e voltou para pegá-los “. Caso soubesse que todos seus pertences estavam com ele, certamente continuaria a caminho de Eretz Yisrael
Os comentaristas insistem que Yaakov Avinu voltou para pequenos jarros, pois para os justos, o dinheiro é mais preferível que seus próprios corpos. Realmente, isto pode acontecer?!? Que os justos devem atribuir mais importância ao dinheiro do que aos seus corpos? O dinheiro é algo que vai e volta, enquanto o corpo dele vai com toda a vida até cento e vinte !!!
Para observar e compreender o significado mais profundo desta passagem, devemos aprofundar na explicação da salvação de Moshe Rabeinu ao estar na cesta do Rio Nilus.
Consta na Torá (Shemot 2:3), que Moshe foi posto numa cesta, para estar protegido no Rio Nilus durante o tempo que estaria lá e que não seja afetado pelas águas.
Rabi Elazar explica que daqui se aprende que para os justos, seus pertences valem mais de que seus próprios corpos, pois os justos não põe as mãos em coisas roubadas. Explica Rashi, que Moshe foi posto em cesta barata, mesmo que seu corpo ficaria mais protegido caso fosse posto em cesta mais cara. Isto é por que a cesta foi comprada com preço mais barato, pois não havia necessidade de ser comprada com preço maior.
Rabi Shmuel Bar Nachmani explica que Moshe foi posto numa cesta flexível, que pode resistir tanto cosias rígidas, quanto coisas flexíveis. Explica Rashi, que deste modo Moshe fica mais protegido, pois a coisa rígida quando é balançado pela água, pode quebrar ao bater em outra coisa rígida. Porém caso se trate de algo flexível, resistirá ao bater em algo rígido.
Como o Rabino Elazar e o Rabino Shmuel Bar Nachmani estão em desacordo na realidade, sobre o modo de proteção de Moshe? Ao invés de discutir, eles deveriam ver na prática, como foi feita a cesta!!!!
Tanto Rabi Elazar quanto Rabi Shmuel Bar Nachmani, seguem suas opiniões em outra passagem deste assunto. Consta na Torá (ibid): que a cesta foi untada com argila e asfalto, e a criança foi posta na cesta que foi posta no suf.
Segundo Rabi Elazar, suf significa yam suf (mar vermelho). Rabi Elazar opina que a cesta foi colocada na água, onde há somente receio de que a cesta seja rompida, portanto Moshe foi posto num cesto de madeira, que é mais rígido do que um cesto de material flexível.
O mesmo Rabi Elazar disse (Chulin 91a): “E Yaakov ficou sozinho”, que Yaakov ficou sozinho por causa de pequenos jarros, pois opina que os justos apreciam seus pertences mais do que seu próprio corpo, pois não põe as mãos no roubo.
Portanto, se não há necessidade de fazer uma proteção maior, por que fazê-la? Do mesmo modo, Yaacov Avinu voltou para pegar os jarros pequenos, pelo simples motivo que ele investiu tempo e forças para adquirir estes jarros. Abrindo mão deles, simplesmente ele estava desvalorizando os dias que investiu para adquirí-los, e como é sabido em chazal, que não há perca como a perda de tempo, pois este nunca volta. Porém o corpo, mesmo que pode ser ferido (caso não se trate de perigo de vida), se auto-repõe. Portanto no dilema de investir em restaurar seus pertences que demonstram valorização do tempo ou deixar o corpo intacto, o tsadic escolherá a primeira opção.
Segundo Rabi Shmuel Bar Nachmani, suf significa pântano. Por esta razão, além do perigo de que os animais malignos possam espalhar a cesta, também tem medo de que eles possam driblar na cesta ou agitarem, e cairá no chão. É por isso que uma cesta trançada de material flexível que absorve esses golpes é preferível para evitar que a cabeça do bebê seja atingida.
Assim também aprendemos que em relação as virtudes pessoais de cada um, é sempre melhor ter uma virtude flexível, como consta no Talmud (Taanit 20b): “Imediatamente Rabi Elazar, filho do Rabino Shimon, entrou e ensinou:” Um homem sempre deve ser tão suave como uma pena, e não ser tão duro como um cedro. Por isso que a pena teve o mérito que com ela são escritos Sifrei Torá, Tefilins e Mezuzot.
Pergunta o Maharsha: “Como foi possível economizar à custa da qualidade da arca, uma vez que não há nada que é posto perante a casos de perigo de vida?”
Responde o Maharsha, que realmente segundo a opinião de Rabi Elazar, Moshe não deixava de estar protegido sendo posto na cesta de material mais barato. Caso fosse colocado no material mais caro, estaria mais protegido. Portanto opina Rabi Elazar, que a diferença entre a proteção maior e a proteção menor, deve ser economizada, uma vez que com a proteção menor, Moshe também estará protegido.
De acordo com isso, podemos compreender, que Rabi Elazar e Rabi Shmuel Bar Nahmani não divergem sobre a realidade, e sim que suas palavras se complementam. De modo geral, a cesta de madeira segura mais do que a cesta de material flexível, e com este fato concorda Rabi Shmuel Bar Nachmani com Rabi Elazar. Porém Rabi Elazar concorda também com Rabi Shmuel Bar Nachmani, que caso haja perigo constante, deve ser tomado um cuidado maior.
Mesmo assim, caso não haja uma diferença nítida sendo protegido com material flexível (em caso de perigo constante), mais do que com material rígido, opina Rabi Elazar que devemos economizar neste caso. Rabi Shmuel bar Nachmani opina que não. Neste caso devemos ter a melhor proteção.
Resumindo, segundo Rabi Shmuel Bar Nachmani, o máximo de cuidado é o mínimo exigido. Segundo Rabi Elazar, não há necessidade de fazer algo melhor, caso possamos nos contentar com algo menor, para poupar dinheiro que serviriam para coisas de maior utilidade e necessidade.
Até aqui vimos que a saída de Yaakov para pegar de volta seus pequenos jarros, foi para valorizar seu tempo investido na aquisição de tais jarros.
Porém, parte dos comentaristas explicam que, Yaakov a princípio foi buscar seus jarros, e não só por que os havia esquecido. Seu objetivo era simplesmente dominar a força do mal no mundo. Yaacov deliberadamente partiu para essa luta feroz.
De qualquer maneira, lá na escuridão da noite, foi formado o fundo da aparência do anjo na luta com Yaakov até o amanhecer. A grande luta atingiu o trono da honra e terminou com a vitória de Yaakov. E no final ele pôde subjugar o anjo que o abençoou e deu-lhe o sublime nome: “Israel”
E na força desta luta, o midrash (Bereshit Raba 77: 1) diz coisas maravilhosas e sublimes: “Rabi Berechiah, em nome de Rabi Simon, disse:” Não há (ninguém) como D'us. Porém quem é como D'us: Israel o ancião (Yaakov Avinu).
Do mesmo modo que em relação a D'us está escrito (Ieshaiahu 2:11): “E somente D'us somente será exaltado naquele dia”, assim também sobre Yaakov está escrito (ibid) “E Yaakov ficou sozinho… “
Qual é o significado da comparação entre o estar só de D'us (sendo exaltado) e o estar só de Yaakov Avinu (na luta com o anjo). Essa comparação exige compreensão e aprofundamento. Assim também devemos entender a mensagem espiritual que todo judeu aprende dessa luta?
Estamos lidando com uma luta celestial totalmente abstrata entre um anjo que representa todas as forças das trevas no mundo superior e nosso antepassado Yaakov, que é o mais amado dos patriarcas, que sua imagem está gravada no trono da glória. Chazal nos ensinaram, que a Torá não é um livro de contos, sem que haja algum aprendimento para qualquer Yehudi. Nós não temos negócios com os anjos e menos ainda na luta contra eles. Sendo assim, qual é a mensagem aprendida com este ato?
Rabi Yerucham de Mir em seu livro Da'at Torah nos ensina um elemento grande e central que aprendemos a partir daqui: “observaram chazal no versículo,” E Yaakov ficou sozinho… “, que há comparação entre as virtudes de D'us e as virtudes de cada ser-humano.
Existem várias situações relacionadas à liderança de D'us no mundo. Há a camada visível, que aparentemente parece que D'us necessita de nossos atos para que seja melhor a reparação do mundo,porém, em camada mais profunda, D'us não precisa de nada de ninguém, pois não há nada a não ser ele.
“E Yaakov ficou sozinho…” Isto não significa que ele permaneceu abandonado sem ajuda … e neste ponto de fraqueza, um “homem” encontrou um ponto para lutar com ele. Aqui, justamente este “homem” encontrou com ele, de acordo com as palavras de Chazal, esse é o momento de maior grandeza de Yaakov, quando estava “sozinho” comparado ao estar sozinho de D'us. Neste ponto, não necessitava de nenhum auxílio, pois estava abençoado na medida de estar sozinho.
“Quando o perverso Nimrod jogou Avraham Avinu para o forno de fogo, o anjo Gabriel disse à D'us: Senhor do mundo, descerei e esfriarei e salvarei o tsadic deste forno de fogo”.
D'us lhe respondeu:
“Eu sou único no meu mundo, e ele é único em seu mundo, é bonito que o único salve o único “.
A virtude de D'us é ser “único e sozinho”. Avraham Avinu tinha a virtude de ser singular, assim também Yaakov.
No espírito dessas palavras, o Malbim explica: “E Yaakov ficou sozinho” ele se preparou para receber a profecia, se desfazendo das posses materiais e assim, por isso que ele ficou sozinho, com a luz superior espiritual.
A pergunta é, como nós num nível que nem alcança a parte mais baixa do calcanhar de Yaakov Avinu, podemos chegar á este nível?
Consta na Mishná (Pirkei Avot 4:1): Ben Zoma diz: “Quem é o homem sábio? É aquele que aprende de cada homem. Quem é o herói? É aquele que conquista seus instintos? Quem é o rico? É aquele que é feliz por sua própria parte. Quem é a pessoa honrada? É aquele que respeita as outras pessoas.”
À luz disso, Rabi Yerucham de Mir, explica uma interpretação maravilhosa dos conteúdos desta Mishna: “Ben Zoma nos revela um maravilhoso segredo, que o homem tem dentro dele e ele mesmo todas as virtudes! A grandiosidade destas virtudes, não depende de ninguém, somente da própria pessoa, e somente quando elas vêm da própria pessoa.
Todas as virtudes são valiosas somente quando elas vêm de dentro da pessoa, pois todos os meios externos nuncam acompanham o homem, mais do que ele mesmo os acompanha.
Esta é a singularidade de estar “sozinho”. Yaacov Avinu ficou sozinho para demonstrar, que todas suas virtudes não serão valorizadas a não ser que esteja sozinho. Ou seja, não se apoiando em nenhum meio externo, somente nas forças concedidas por D'us a ele.
O comportamento da pessoa deve ser tal, que deve participar do público em geral, mas por outro lado ser singular em suas virtudes, e não depender dos outros.