“Dois amigos jardineiros eram donos de um belo pomar de macieiras. As árvores eram muito bonitas, e produziam lindas e deliciosas maçãs. Cada ano que passavas havia uma nova safra, com frutas ainda mais bonitas e gostosas. Até que certo dia, após refletir muito, um dos jardineiros virou-se para o outro e falou:
– Veja só, estamos desperdiçando nossas macieiras com estas técnicas antiquadas. As raízes, que são tão feias e sujas, conseguem produzir maças bonitas assim. Então se arrancarmos uma árvore, virarmos ao contrário e enterrarmos seus lindos galhos e folhas na terra, imagine quão lindos serão os seus frutos!
O outro jardineiro gostou tanto da lógica do seu amigo que imediatamente começou a arrancar algumas árvores e a plantá-las de cabeça para baixo. As raízes feias e sujas ficaram para cima, enquanto as belas folhas e os galhos ficaram enterrados.
Passou um tempo e nada cresceu. Mas os jardineiros estavam tão obcecados com a idéia que repetiram novamente o processo, arrancando outras árvores e plantando-as de cabeça para baixo. Eles estavam dispostos a repetir o processo outra e outra vez, até que tivessem sucesso. E assim fizeram, até que perceberam que a idéia havia sido um grande desastre. Não havia mais nenhum fruto crescendo naquele pomar feio e sujo, que um dia havia sido tão bonito e frutífero.
Desanimados, os jardineiros sentaram-se para lamentar sua má sorte quando viram que milagrosamente uma maça havia sobrado. Rapidamente retiraram suas sementes e as plantaram. No ano seguinte uma pequena muda de macieira começou a brotar, e dessa muda renasceu a esperança para o futuro”
Apesar do judaísmo ter florescido muito durante séculos, as últimas gerações de judeus se viram na obrigação de “modernizar” o judaísmo, implantando estilos novos, lógicos e modernos de vida, na esperança de produzir gerações melhores. A idéia não funcionou e, ao contrário do esperado, a assimilação quase acabou com o povo judeu. Felizmente uma “maça” se salvou, e dela deve renascer o futuro do nosso povo. Esta maça é o movimento de Teshuvá (retorno ao judaísmo), do qual cada vez mais participam os judeus em todo o mundo.
A Parashá desta semana, Shoftim, traz algumas leis sobre as guerras de conquista da terra de Israel. Por exemplo, a Torá ensina que algumas pessoas estavam isentas de ir para a frente de batalha, entre elas as pessoas que estavam com medo, pois elas poderiam influenciar negativamente as pessoas em volta delas. Outra lei que a Torá ensina é a de dar sempre a possibilidade da paz antes de iniciar o ataque a uma cidade. E finalmente, após muitas leis sobre as guerras e batalhas, a Parashá encerra o assunto com uma idéia muito interessante: a proibição de cortar as árvores frutíferas de uma cidade sitiada, como está escrito: “Quando vocês forem sitiar uma cidade por muitos dias para guerrear contra ela, para conquistá-la, não destrua suas árvores com o machado, pois delas vocês comerão; não as cortarão, pois o homem é como a árvore do campo…” (Devarim 20:19). Deste versículo aprendemos uma lição muito grande para nossas vidas: mesmo quando um judeu está em uma situação de vida ou morte, sob uma grande pressão psicológica, ele deve se lembrar de sua obrigação no mundo de fazer bondades.
Esta proibição de cortar as árvores frutíferas se chama “Bal Tashchit”, e se aplica a evitar qualquer tipo de desperdício. Mesmo uma pequena uva não pode ser desprezada e atirada no lixo sem motivo. Mas observando a linguagem do versículo, surge uma dúvida. Por que a Torá compara o homem com a árvore do campo? Qual a semelhança?
Ensinam nossos sábios que observando as árvores podemos aprender muito sobre nós mesmos e sobre o nosso propósito neste mundo. Por exemplo, sabemos que cada árvore é única e especial nos cuidados que necessita. Existem árvores que necessitam de mais água, outras de mais sol, outras necessitam de locais tranquilos. Se colocarmos mais água do que uma árvore necessita ela morre, e se colocarmos menos água ela seca. Se a árvore receber menos sol do que precisa ela não se desenvolve bem, mas se receber mais sol do que necessita ela queima. Portanto, cada uma deve receber uma atenção e um cuidado especial. Assim também são os seres humanos, cada pessoa é única e tem necessidades únicas, e temos que ajudar cada pessoa exatamente no que ela necessita. É um grande erro que muitos pais cometem quando tentam dar a todos os filhos exatamente a mesma educação. Cada filho é único, cada um tem diferentes necessidades e precisam de uma atenção especial.
Outro ensinamento importante que aprendemos das árvores é que elas dependem da terra para retirar água e nutrientes, mas sem o sol para fazer fotossíntese elas não sobrevivem. Este também é um dos grandes ensinamentos do judaísmo. Segundo muitas religiões, o ideal é a pessoa se afastar completamente do mundo material e viver uma vida apenas espiritual. Voto de silêncio, voto de castidade e constantes castigos ao corpo representam o máximo de espiritualidade que se pode atingir. Porém, o judaísmo ensina justamente o contrário. D'us criou o mundo material para que justamente possamos tirar dele proveito. Porém, da mesma forma que uma planta não pode viver apenas dos nutrientes do solo, ela também necessita do sol, assim também nossa vida não pode ser voltada apenas à busca de prazeres materiais, sem nenhuma motivação espiritual. Podemos e devemos ter prazeres na vida, mas quanto mais voltados ao nosso crescimento espiritual, maior o prazer que sentimos.
Também podemos aprender das árvores que, se plantarmos maçãs, não devemos esperar uma colheita de laranjas. Assim também ocorre em nossas vidas, colhemos os frutos de áreas onde investimos, mas no que não investimos não colhemos bons frutos. Dedicamos anos e anos para aprender nossas profissões. Faculdade, mestrado, cursos profissionalizantes. O resultado é que temos no mercado de trabalho profissionais cada vez mais capacitados e competentes. Mas quanto investimos para ser um bom marido ou uma boa esposa? Quanto tempo nos dedicamos para aprender a cuidar dos nossos filhos? É por isso que chegamos a índices de mais de 60% de divórcios e cada vez mais casos de delinquência juvenil. Colhemos somente o que plantamos.
Mas talvez a comparação mais interessante entre as árvores e os seres humanos é a forma de saber se estamos vivendo uma vida espiritualmente saudável ou não. Se olharmos a parte externa das árvores, muitas vezes elas parecem saudáveis, apesar da parte interna estar completamente podre. A única maneira de saber de verdade como ela está por dentro é observando os frutos. Árvores saudáveis produzem bons frutos, árvores doentes produzem frutos ruins. O mesmo se aplica aos seres humanos, é através dos nossos frutos, isto é, dos nossos filhos e alunos, que podemos saber se realmente estamos fazendo o que é correto.
Nos últimos 3.000 anos existiram muito movimentos que tentaram “adaptar” o judaísmo à modernidade, como por exemplo os Caraítas (judeus que negavam a divindade da Torá Oral) e outros movimentos reformistas que surgiram durante nossa história. Aparentemente as idéias de modernizar o judaísmo sempre pareceram boas, pensava-se que teriam bons resultados para trazer os judeus de volta ao judaísmo. Porém, quais foram os frutos? Os Caraítas, que fizeram tanto barulho há 2.000 anos atrás, já não existem mais. E os modernos movimentos reformistas olham, sem poder fazer nada, o judaísmo se perdendo por causa da crescente assimilação. O único movimento que segue firme, há mais de 3.000 anos, é o judaísmo baseado nos imutáveis ensinamentos da Torá Escrita e da Torá Oral.
Uma criança que recebe uma boa educação judaica dificilmente se assimilará e perderá seu judaísmo. Um aluno que recebe uma boa base espiritual judaica na escola não sente a necessidade de modernizar nada. Se olharmos os bons frutos que saem de uma boa educação judaica, chegaremos à conclusão que não há nada tão bom e tão atual quanto os ensinamentos da Torá.
SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm