“Um grande rabino, interessado em fundar um Kolel (Centro de estudos de Torá para homens casados) na cidade de Cholon, em Israel, foi perguntar ao Rav Elazar Man Shach, o maior rabino da geração passada, qual seria o local mais adequado para a abertura deste Kolel. O Rav Shach, após refletir por alguns instantes, respondeu que o ideal seria procurar um local bem visível, por onde muitas pessoas passassem durante o dia e durante a noite, e explicou:
– Se as luzes do Kolel estiverem acesas tarde da noite e as pessoas escutarem a melodia da Torá sendo estudada, elas receberão influencia para se fortalecerem no estudo e no cumprimento da Torá.
Certo dia, algum tempo depois da inauguração do Kolel, um velhinho com cerca de 70 anos de idade e aparentando não ser conhecedor da Torá entrou lá pela primeira vez. Ele pediu ao Rosh Kolel (rabino responsável) um professor que pudesse ensiná-lo a estudar o Talmud. Aos pouquinhos ele foi se aproximando da Torá e das Mitzvót e, em algumas semanas, este velhinho tinha mudado completamente sua vida. O Rosh Kolel, curioso, perguntou ao velhinho o que o havia motivado a ir estudar no Kolel. O velhinho explicou:
– Em 1948, eu fazia parte de uma unidade especial do exército de Israel que tinha como objetivo atacar e conquistar a Academia de Polícia Árabe. As duas primeiras tentativas foram desastrosas, causando muitas baixas na nossa unidade. Antes da terceira tentativa, um dos soldados da unidade, que era religioso, sugeriu que todos estudassem juntos algumas Mishnaiót (parte da Torá Oral) para o sucesso da missão. Ele leu as Mishnaiót em voz alta e com uma linda melodia por cerca de 15 minutos. Depois disso, quando finalmente atacamos a Academia de Polícia Árabe, obtivemos um grande e rápido sucesso.
– Nos últimos 50 anos eu desejei escutar novamente aquela maravilhosa melodia – continuou o velhinho – mas não sabia onde procurá-la, até que naquela noite eu estava passando pelo Kolel e pude ouvir aquela linda melodia sendo cantada por alguém que estudava. Foi por isso que eu entrei aqui pela primeira vez”.
Cada bom ato que fazemos fica guardado para sempre. Não somente o bom ato, mas todas as consequências positivas que ele pode trazer. Aquele soldado religioso nunca sonhou que sua melodia ao estudar a Torá ajudaria, 50 anos depois, a aproximar um velho judeu que estava completamente afastado da Torá. (História Real, retirada do livro “Major Impact, de autoria do R' Dovid Kaplan)
Na Parashá desta semana, Shoftim, a Torá nos ensina um pouco sobre as guerras do povo judeu. E um dos ensinamentos interessantes é em relação às pessoas que eram dispensadas da guerra. Entre elas estava a pessoa que sentia medo, como está escrito: “Quem é o homem que sente medo e amolece seu coração? Que ele volte para sua casa, e que não derreta o coração de seus companheiros como o seu coração” (Devarim 20:8). Em outras palavras, a Torá está dando a possibilidade a esta pessoa, que está com medo de ir para a guerra, de abandonar o campo de batalhas para não influenciar de maneira negativa seus companheiros, o que causaria uma reação em cadeia que prejudicaria todo o desempenho do exército.
Explica o Ramban (Nachmânides) que este versículo da Torá não está ensinando que a pessoa com medo tem a opção de voltar para casa. Segundo ele, esta é uma das 613 Mitzvót da Torá, isto é, havia uma proibição da Torá de causar medo em seus companheiros. Portanto, se uma pessoa sentia medo e mesmo assim não abandonava o campo de batalhas estava transgredindo uma das Mitzvót da Torá.
Ensina o Rav Chaim Shmulevitz que esta Mitzvá é mais abrangente e inclui qualquer tipo de comportamento nosso que influencie de maneira negativa as pessoas que nos veem. Isto se aplica até mesmo se a pessoa tem justificativas corretas para se comportar de certa maneira, mas que pode ser interpretado de maneira negativa pelas pessoas em volta. Por exemplo, alguém que sai mais cedo da Tefilá (reza), antes de terminar todas as partes necessárias, mesmo se o fizer pelos motivos corretos, passa para as pessoas em volta a impressão de que ele despreza estes momentos de conexão com D'us, e as pessoas podem aprender com ele a se comportar de maneira leviana no momento das rezas. O correto, portanto, seria a pessoa revelar para aqueles que rezam com ela qual o motivo que a faz sair mais cedo, tirando qualquer tipo de mal entendido.
Mas até onde vai a nossa responsabilidade em relação à influência que causamos aos outros? A resposta está na Amidá (reza silenciosa) de Mussaf que fazemos em Rosh Hashaná, o Dia do Julgamento, quando D'us julga todos os nossos atos. E assim falamos na Amidá: “(são lembrados) os atos do ser humano e suas contas”. Que os atos da pessoa sejam lembrados no Dia do Julgamento é algo fácil de entender, mas o que significa que “suas contas” serão lembradas? Explica o Rav Chaim Vologziner que cada pessoa tem certo círculo de influências, que inclui sua família, seus amigos e qualquer pessoa que tenha contato com ela. A forma como ela influencia estas pessoas através de seus atos é chamado de “suas contas”, e parte do julgamento de Rosh Hashaná é nesta área também. Isso quer dizer que se as pessoas se inspirarem nos nossos atos e assim melhorarem suas atitudes na vida, seremos recompensados por cada bom ato que elas fizerem, mas se as pessoas aprenderem de nós a se comportarem de uma maneira inadequada, então parte dos erros delas serão também cobrados de nós.
Mais do que isso, o Talmud ensina que o Livro da Vida e o Livro da Morte são abertos em Rosh Hashaná. Tossafot, um dos comentaristas do Talmud, explica que isto quer dizer que os mortos também são julgados em Rosh Hashaná. Mas pelo que eles são julgados, se já faleceram e não fazem mais nada? Mesmo depois da morte, os atos que uma pessoa fez em vida podem influenciar outras pessoas, positivamente ou negativamente. Por isso os mortos também são julgados em Rosh Hashaná, não pelos seus próprios atos, mas pelos atos que foram cometidos por outras pessoas em consequência de sua influência.
Além do benefício direto de todos os méritos que recebemos ao influenciar positivamente outras pessoas, há outro grande benefício em ser um modelo de boa conduta para os outros. Existe uma Mitzvá da Torá de dar uma bronca em alguém que fez algo errado, como está escrito “Advirta seu companheiro, para que a transgressão não recaia sobre você” (Vayikrá 19:17). Porém, é muito difícil cumprir esta Mitzvá sem magoar ou envergonhar a pessoa que errou. Então como cumprir esta Mitzvá sem correr o risco de cometer a transgressão de ofender o próximo? De acordo com o Rav Aron Kotler, quando uma pessoa se comporta intencionalmente de maneira exemplar em certa área, com o objetivo de se tornar um modelo de boa conduta para pessoas que insistem em cometer certos tipos de erro, então é considerado como se a pessoa tivesse cumprido a Mitzvá de advertir o próximo, sem correr o risco de causar qualquer constrangimento ou mágoa. Por exemplo, aquele que é cuidadoso em nunca falar nem escutar Lashon Hará (maledicência sobre outras pessoas) faz com que sua mera presença seja um lembrete e um “puxão de orelha” naqueles que gostam de falar Lashon Hará, e certamente eles não se atreverão a transgredir diante desta pessoa. Assim as pessoas melhorarão seus atos mesmo sem a necessidade de efetivamente receberem uma bronca.
Portanto, temos uma grande responsabilidade na vida, e em especial no mês de Elul, o último mês do ano, a preparação final para o nosso Julgamento de Rosh Hashaná. Como sempre há alguém nos observando em praticamente tudo o que fazemos em nossa vida, é importante sermos cuidadosos em cada pequeno ato, para termos a certeza de que estamos sempre influenciando as pessoas à nossa volta para o bem. Pois como ensina o ditado, um ato vale mais do que mil palavras.
SHETIKATEV VETECHATEM BESSEFER CHAIM TOVIM (Que sejamos inscritos e selados no Livro da Vida)
SHABAT SHALOM
Rav Efraim Birbojm