“O Rav Elchanan Wasserman desde cedo se destacou muito no estudo da Torá. Depois de casar, foi morar na casa do seu sogro e recusou muitos cargos rabínicos, alguns que lhe trariam muito prestígio, pois preferia se dedicar apenas ao estudo de Torá. Alguns anos mais tarde, começou a ensinar Torá e montou uma Yeshivá (Centro de estudos de Torá) para jovens alunos, onde começou a se destacar muito como professor de Torá.
Passados alguns anos, para evitar uma possível discussão com um rabino local, o Rav Elchanan Wasserman saiu do comando da Yeshivá e foi estudar no Kolel (Centro de estudos de Torá para homens casados) dirigido pelo Rav Israel Meir HaCohen, o Chafetz Chaim, onde continuou se destacando muito pela sua constância e dedicação nos estudos. Incentivado pelo Chafetz Chaim, montou uma nova Yeshivá para jovens alunos, mas a Primeira Guerra Mundial fez com que ele tivesse que fugir para vários lugares.
Após o fim da guerra, o Rav Elchanan Wasserman foi para a Polônia e tornou-se o Rosh Yeshivá (Diretor) de Novardok, que mais tarde, graças à sua genialidade, tornou-se a uma das Yeshivót mais famosas da Europa. A Yeshivá cresceu muito e, em poucos anos, tinha mais de 300 alunos. Influenciou de maneira significativa todo o Mundo de Torá da Europa e tornou-se um dos líderes de sua geração.
Mas momentos difíceis vieram e não havia mais dinheiro nem mesmo para comprar comida para os alunos. O Rav Elechanan Wasserman então decidiu viajar para os Estados Unidos, onde tinha certeza que conseguiria juntar muito dinheiro para a Yeshivá. Enquanto ainda estava nos Estados Unidos começou a Segunda Guerra Mundial, e muitos aconselharam o Rav Elchanan a ficar na América, onde estaria seguro. Voltar para a Europa, com o avanço das tropas nazistas, seria certamente um grande risco de vida. Mas ninguém conseguiu convencer o Rav Elchanan a ficar. Sua única preocupação era com seus alunos, que haviam ficado sozinhos na Europa, sem um guia espiritual para ajuda-los naquela situação difícil.
E a decisão do Rav Elchanan Wasserman se mostrou acertada. Ele voltou para a Europa e por algum tempo ainda conseguiu ensinar Torá aos seus alunos e tranquilizá-los. Mas o cerco nazista foi se fechando cada vez mais até que o Rav Elchanan Wasserman sentiu que o fim se aproximava. Então ele reuniu os judeus que estavam com ele em Slobodka e fez um último discurso emocionado, que reviveu o espírito quebrado dos judeus. Ele ressaltou que a morte deles era para trazer expiação a todo o povo judeu, como os Korbanót (sacrifícios) que eram oferecidos no Beit Hamikdash (Templo). Ressaltou que eles não deveriam ter nenhum questionamento sobre a bondade e os caminhos de D'us, e assim, com Emuná (fé) completa, eles morreriam em total pureza espiritual, cumprindo a Mitzvá de santificar o nome de D'us. Afirmou que a morte deles não seria em vão, pois salvaria a vida de milhões de judeus que estavam do outro lado do oceano. E finalizou dizendo que o fogo que consumiria seus corpos seria o mesmo fogo que reconstruiria o Beit-Hamikdash em Jerusalém. Em 1941, o Rav Elchanan Wasserman foi preso e morto por colaboradores nazistas na Lituânia”
O Rav Elchanan Wasserman poderia ter pensado apenas em si mesmo e salvado a sua vida. Mas ele preferiu pensar nos outros, e decidiu não deixar seus alunos sozinhos. No final, além de toda a Torá e o incentivo que ele conseguiu transmitir aos alunos, ele meritou cumprir, de maneira completa, a Mitzvá de santificar o nome de D'us.
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Nesta semana lemos a Parashá Terumá que, entre outros assuntos, descreve a doação dos materiais necessários para a construção do Mishkan (Templo Móvel) e para a confecção das roupas dos Cohanim (sacerdotes), como está escrito: “A oferenda que vocês tomarão deles será a seguinte: ouro, prata e cobre… Pedras de ônix e “Avnei Miluim” (pedras preciosas) para o efod e para o peitoral” (Shemot 25:3,7). As pedras preciosas foram doadas para serem utilizadas em uma das roupas do Cohen Gadol (Sumo sacerdote), chamada peitoral. Nela eram incrustadas 12 pedras preciosas, cada uma representando uma das 12 tribos de Israel.
É interessante notar que as pedras preciosas utilizadas no peitoral receberam um nome coletivo, “Avnei Miluim”. Rashi, comentarista da Torá, explica que este nome, que literalmente significa “as pedras de preenchimento”, descreve a função destas pedras preciosas. No peitoral do Cohen Gadol havia 12 “engastes” feitos de ouro, formando cavidades onde as pedras deveriam ser encaixadas. Portanto, a função das pedras, como o nome sugere, era encaixar-se e preencher a cavidade dos engastes de ouro.
Mas desta explicação do Rashi ficam duas perguntas. Em primeiro lugar, por que a Torá atribuiu às pedras preciosas um nome “menos nobre”, sugerindo que elas eram apenas “preenchedoras de um espaço vazio”, ao invés de atribuir a elas um nome que acentuasse sua beleza e seu elevado valor? Além disso, cada pedra representava uma das 12 tribos de Israel, com suas qualidades e identidades únicas. Então por que as pedras receberam um nome coletivo, o que aparentemente anulava a individualidade e a singularidade de cada uma delas?
Responde o Rav Yohanan Zweig que este pequeno detalhe escrito na Torá nos ensina um fundamento muito importante para nossas vidas. É muito comum ocorrer situações nas quais ficamos divididos entre ficar em um lugar que necessita do nosso talento ou mudar para outra área que parece ser mais propícia para o nosso crescimento pessoal. O que é mais importante? O que é o correto a se fazer? Devemos pensar nos outros, isto é, na necessidade coletiva, ou em nós mesmos e no nosso próprio crescimento? As pedras preciosas nos ajudam a resolver este dilema. Apesar de que a beleza e o valor individual de cada pedra seriam certamente ressaltados caso cada uma delas estivesse isolada do conjunto, a Torá descreve que a função das pedras era ficar em seus devidos lugares, fazendo parte de um conjunto. Com isso a Torá nos ensina que é preferível a pessoa ficar no lugar onde necessitam dela, ao invés de mudar para uma área que parece ser mais propícia para o seu crescimento pessoal, mas onde ela não é tão necessária.
A saída de alguém de um local onde ele é muito necessário causa um impacto muito negativo naqueles que ficam, deixa um grande vazio. É como no caso das pedras preciosas do peitoral do Cohen Gadol, se apenas uma das pedras preciosas estivesse faltando, o vazio deixado por ela ofuscaria completamente as outras pedras. Poderíamos pensar que este é o ensinamento das pedras preciosas: devemos estar dispostos a nos sacrificar, abrindo mão de nossas necessidades pessoais em prol das necessidades comunitárias.
Mas as pedras preciosas nos ensinam algo ainda mais profundo. A verdade é que a escolha de ficar no local onde a pessoa é necessária é a escolha mais benéfica também para ela mesma. No final das contas, o crescimento pessoal será maior caso ela permaneça no local onde ela é mais necessária, ao invés de ir para o local onde, apesar de ter mais ferramentas de autodesenvolvimento, ela não as utilizará, pois não será tão necessária naquele local. É isto o que a Torá está nos ensinando ao chamar as pedras preciosas de “Avnei Miluim”, dando a elas um nome coletivo e relacionado com sua função de preencher o local criado para elas, ao invés de ressaltar sua beleza e valor individuais. Pois o valor de cada pedra preciosa se tornava ainda maior pelo fato delas terem um local ao qual elas se adequavam perfeitamente.
Este é um ensinamento muito precioso para nossas vidas. Não apenas é muito desejado que uma pessoa pense mais no coletivo do que em si mesma, mas a Torá está ensinando que este é o melhor caminho para ela também. Quanto mais pensamos e ajudamos os outros, mais o nosso brilho e o nosso valor verdadeiro são ressaltados.