Ariel, um judeu religioso e extremamente honesto, foi ao dentista. Ao sair da consulta, encaminhou-se à mesa da secretária e foi informado que sua conta era de 34 shekalim. Ele deu para a secretária duas notas de 20 shekalim, mas a secretária informou que não tinha troco. Ele então procurou moedas em todos os seus bolsos e, após contar as que havia encontrado, percebeu que somavam apenas 13 shekalim. A secretária falou para ele:
– Pague 33 shekalim e, da próxima vez que vier ao consultório, você traz o que faltou.
Mas Ariel não ficou tranquilo. Ele perguntou se ela poderia anotar que ele estava devendo 1 shekel. A secretária respondeu que não, pois o computador estava quebrado.
– Sabe, deixe para lá. Me dê os 33 shekalim e está tudo certo – disse a secretária, querendo facilitar.
– Me desculpe – respondeu Ariel, com tranquilidade – mas como você é apenas funcionária da clínica, não tenho certeza se você pode dispensar este dinheiro que falta. Então vamos fazer o contrário. Para que não fique nenhuma dúvida, pegue os 40 shekalim e a diferença pode ficar para o dono da clínica. Prefiro pagar a mais do que correr o risco de ficar devendo, mesmo que seja apenas 1 shekel.
A secretária, que não era religiosa, não acreditou no que escutou. Admirada, ela comentou:
– Se houvesse no mundo mais pessoas como você, com a sua honestidade, certamente o Mashiach já teria chegado” (História Real, retirada do livro “Major Impact”, de autoria de Dovid Kaplan).
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A Parashá desta semana, Nassó, nos conta que quando o Mishkan (Templo Móvel) foi inaugurado, os líderes das 12 tribos do povo judeu trouxeram suas oferendas particulares, em comemoração ao grande acontecimento. Mas há algo interessante nas oferendas dos líderes. Se prestarmos atenção, apesar de terem sido doações voluntárias e que cada um poder doar o que quisesse, os 12 líderes doaram exatamente as mesmas coisas, para evitar que surgisse inveja, competição e ódio dentro do povo judeu. D'us, querendo demonstrar como esta atitude O agradou, escreveu na Torá a oferenda de cada tribo, isto é, a mesma oferenda foi escrita 12 vezes, demonstrando que, apesar delas serem iguais, cada oferenda foi recebida como sendo única e especial.
Cada um dos objetos que fazia parte da oferenda dos líderes, além de ser um presente doado para o Mishkan, tinha um simbolismo especial. Por exemplo, entre outras coisas, cada líder doou ao Mishkan um novilho de boi, um carneiro e um cordeiro. Explica Rashi, comentarista da Torá, que o novilho correspondia a Avraham, o carneiro correspondia a Ytzchak e o cordeiro correspondia à Yaacov. Mas qual a relação entre estas oferendas e os nossos patriarcas?
Explica o Midrash (parte da Torá Oral) que o novilho representa o Chessed (bondade) de Avraham. Quando ele recebeu os três anjos fantasiados de beduínos, ofereceu a eles língua de boi com mostarda, uma comida dos reis e nobres, mostrando sua extraordinária bondade com os outros. O carneiro representa o temor a D'us de Ytzchak, que estava disposto a ser oferecido a D'us como um sacrifício. Quando um anjo segurou a mão de Avraham e não deixou que ele terminasse o sacrifício de seu próprio filho, um carneiro foi sacrificado no lugar de Ytzchak. Já o cordeiro representa Yaacov, que cuidava dos rebanhos de seu sogro Lavan.
Mas deste Midrash fica uma grande pergunta. Entendemos que o boi represente Avracham e seu incrível nível de Chessed, e que o carneiro represente Ytzchak e seu temor a D'us, que estava acima do próprio temor à morte. Mas que grande característica de Yaacov é representada através de um cordeiro? Qual a grandeza de Yaacov representada pelo fato dele ter sido pastor das ovelhas de Lavan?
Explica o Rav Meir Tzvi Bergman que Yaacov não era um simples pastor de ovelhas. Se prestarmos atenção em seus atos, perceberemos nele uma incrível característica de integridade em assuntos que envolviam o relacionamento com seus semelhantes. Ele chegava a um nível extremo de cuidado para evitar causar qualquer dano ou receber qualquer benefício de outros se houvesse qualquer indício de ilegitimidade neste ato. Esta honestidade extrema de Yaacov foi demonstrada durante os 20 anos pelos quais ele foi pastor de ovelhas de seu tio Lavan, uma pessoa traiçoeira e desonesta. Apesar de centenas de vezes seu tio Lavan ter mudado as regras do seu pagamento, apesar de todas as tentativas de trapaça e enganação, Yaacov nunca se desviou de sua integridade absoluta. Mesmo quando ele teve oportunidade de “dar o troco” e enganar seu sogro, Yaacov se manteve firme em suas convicções.
Uma destas oportunidades foi quando Lavan decidiu que o pagamento de Yaacov seria os animais do rebanho que tivessem manchas ou listras, que eram, na verdade, os animais menos desejados. Então Yaacov utilizou uma artimanha especial: quando os animais em época de acasalamento olhavam para uma vara descascada, que ele colocou estrategicamente no local onde os animais bebiam água, os filhotes nasciam listrados ou manchados.
Mas explica o Radak que Yaacov não utilizou esta artimanha indiscriminadamente. Ele poderia utilizar em todos os animais, fazendo com que todos os filhotes saíssem manchados e listrados, deixando Lavan sem nenhum animal. Porém, apesar de ter sido tantas vezes enganado, Yaacov não fez isto. Ele mostrava a vara descascada apenas aos animais que já eram manchados e listrados, para que seus filhotes também saíssem à sua imagem, manchados e listrados. Assim ele assegurava que nenhum dos animais que nasceriam dos manchados e listrados seria completamente branco.
Mas se o acordo com Lavan era que os animais listrados e manchados seriam de Yaacov, então mesmo se deles nascessem animais sem manchas ou listras, eles pertenceriam legalmente à Yaacov. Então por que ele utilizou esta artimanha de fazer com que todos os filhotes dos animais manchados e listrados também saíssem assim, se era algo desnecessário?
Daqui aprendemos o quanto Yaacov era rigoroso e cuidadoso com a menor possibilidade de fazer algo errado, ou até mesmo de deixar a impressão de que havia feito algo errado. Ele queria ter certeza de que Lavan não teria absolutamente nenhum argumento para dizer que ele o havia roubado. Se houvessem ovelhas brancas, mesmo que fossem legalmente de Yaacov, Lavan certamente as utilizaria como argumento para acusá-lo de roubo. Por isso Yaacov chegou ao extremo de utilizar a artimanha das varas descascadas apenas para afastar qualquer suspeita, evitando que o nome de D'us fosse denegrido.
Este é o entendimento do Midrash, que associa o cordeiro com Yaacov. Yaacov representa a Emet (verdade), e ele sabia que a verdade não é medida apenas em termos absolutos, mas também de acordo com a maneira como cada um a percebe. Ele chegou ao extremo de se preocupar com sua honestidade e com a forma como seria visto pelas outras pessoas. Mesmo que Lavan o enganava abertamente, centena de vezes, Yaacov conseguiu passar no teste, e esta característica ficou marcada nele para sempre.
Ensinam os nossos sábios que devemos sempre nos perguntar: “Quando nossos atos chegarão ao nível dos atos dos nossos antepassados, Avraham, Ytzchak e Yaacov?”. Será que estamos perto da honestidade de Yaacov? Quando alguém no banco nos dá troco a mais, nós imediatamente devolvemos, ou ficamos com o dinheiro e racionalizamos “eles me roubam tanto, cobrando taxas injustas, agora eu estou apenas fazendo justiça”? Nos importamos com pequenas quantias que ficamos devendo aos outros? Tomamos cuidado para não utilizar, para assuntos pessoais, o telefone e o computador do escritório, ou mesmo o nosso tempo de trabalho?
As pessoas entendem que para saber como cumprir as Mitzvót, com todos os seus detalhes, é importante se aconselhar com um rabino. Sempre quando surge uma dúvida, todos sabem a quem recorrer. Mas em relação aos negócios, achamos que não é necessário nenhum tipo de aconselhamento. Chegamos a achar que existem duas vidas independentes, uma no escritório e outra em nossa vida particular. Mas nos ensina o Talmud (Shabat 31a) que no momento em que sairmos deste mundo, D'us nos fará 3 perguntas. E justamente a primeira pergunta será: “Você foi honesto nos seus negócios?”. Antes mesmo de D'us nos perguntar se esperamos ansiosamente pela salvação ou se fixamos tempos para o estudo da Torá, D'us questionará nossa honestidade nos negócios.
A honestidade nos negócios envolve muitas Mitzvót da Torá, e aquele que não se preocupa pode estar transgredindo todas elas. A obrigação de garantir que os pesos e as medidas estejam corretos, a proibição de enganar uma pessoa (Gneiva Dáat), a proibição de causar qualquer dano monetário (Onaát Mamon), a proibição de “colocar uma pedra na frente de um cego”, além da possibilidade de causar “Chilul Hashem” (denegrir o nome de D'us) são apenas alguns exemplos de proibições que uma pessoa que é desonesta nos negócios pode transgredir. E como passamos grande parte do nosso dia no trabalho, não ter cuidado com a honestidade pode ter consequências desastrosas na nossa espiritualidade.
O ser humano tem uma enorme atração por dinheiro. E como em todas as áreas nas quais nós sentimos um forte desejo, a Torá exige de nós autocontrole. Não enganar os clientes de nenhuma maneira, pagar nossas dívidas na data correta, não cobrar mais do que o valor real de um produto e questionar um rabino quando surgem dúvidas em questões monetárias são alguns exemplos de desafios do nosso autocontrole nesta área. A grandeza de Yaacov foi sua honestidade mesmo diante da malandragem de Lavan. Pois o teste de uma pessoa não é se ele se comporta eticamente quando os outros também estão se comportando eticamente com ele. O teste verdadeiro é quando a pessoa mantém a ética nos negócios mesmo que todos os outros não se preocupam mais com isso.