“Arthur, um grande empresário, tinha tido um dia duro. Tudo o que ele queria era entrar em um restaurante para jantar e relaxar. Ele foi recebido por um garçom muito simpático, que o conduziu até sua mesa. Arthur soltou o último botão da camisa, afrouxou a gravata, sentou-se confortavelmente na cadeira e escolheu seu prato favorito. Quando o garçom já ia em direção à cozinha levar o pedido, Arthur chamou-o e pediu:
– Está muito calor. Será que você poderia ligar o ar condicionado?
O garçom deu um sorriso, balançou a cabeça positivamente e foi imediatamente para uma sala nos fundos do restaurante. Passados alguns minutos, o garçom foi novamente chamado por Arthur, que reclamava que agora o frio estava tão intenso que estava até mesmo incomodando. Pediu para que o garçom desligasse o ar condicionado. Balançando positivamente a cabeça e sem perder o bom humor, o garçom novamente se dirigiu à sala nos fundos. Mais alguns minutos e o garçom novamente foi chamado. Arthur já não aguentava mais o calor que fazia dentro do restaurante, e novamente pediu para que o garçom ligasse o ar condicionado. Com uma paciência que parecia interminável, o garçom deu um sorriso, balançou a cabeça e novamente foi para a sala dos fundos.
Neste momento, uma senhora idosa, que estava sentada em uma das mesas do fundo do restaurante, não aguentou. Ela chamou o garçom de canto e desabafou:
– Mas que homem chato! Ele deve estar te deixando louco, não?
O garçom abriu um enorme sorriso, deu uma piscada para a senhora e respondeu:
– É ele que esta ficando louco, minha senhora. Nós não temos ar condicionado…”
A piada é engraçada, pois confundir entre calor e frio não causa nenhum problema para ninguém. Mas quando o que está em jogo é confundir o que é certo e o que é errado, então é bom estar atento e não deixar se deixar influenciar pelo ambiente.
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Nesta semana começamos o quarto livro da Torá, Bamidbar, que descreve muito acontecimentos importantes dos 40 anos em que o povo judeu caminhou pelo deserto, antes da entrada na Terra de Israel. E a Parashá desta semana, Bamidbar, começa com uma contagem de todo o povo. Apenas a tribo de Levi foi contada separadamente, por causa do seu nível espiritual mais elevado, diferente do resto do povo. Há um versículo na Parashá que ressalta o nível diferenciado da tribo de Levi: “Eis que Eu peguei os Leviim dentre os Filhos de Israel, no lugar de cada primogênito” (Bamidbar 3:12). O que significa que D'us pegou os Leviim no lugar dos primogênitos?
Quando Moshé subiu no Monte Sinai para receber a Torá, ele avisou que permaneceria lá por 40 dias. O povo ficou ansiosamente esperando a volta de Moshé, mas uma falha na contagem fez com que o povo achasse que o prazo estipulado já havia expirado e que Moshé havia morrido. O papel de Moshé era muito central no povo judeu. Por ser um profeta em um elevado nível espiritual, sempre que D'us queria transmitir algo ao povo judeu, o fazia através de Moshé. O povo ficou tão perturbado que decidiu que era necessário um novo líder para conduzi-lo no deserto. Mas havia dentro do povo judeu outro grupo, chamado pela Torá de “Erev Rav” (que literalmente significa “uma grande mistura”), composto por egípcios que haviam decidido se unir ao povo judeu no momento da saída do Egito. Mas a escolha destes egípcios não havia sido de coração. Eles saíram junto com o povo judeu apenas por medo do castigo, não por amor a D'us e Suas leis. Por isso, quando o ambiente de confusão se espalhou pelo acampamento, imediatamente eles voltaram às suas crenças idólatras e, através de feitiços, fabricaram o Bezerro de ouro. O resto do povo, completamente sem rumo, acabou se desviando também atrás deles. Isto causou com que D'us ficasse furioso e quisesse destruir o povo inteiro, e isto somente não aconteceu por causa da intervenção de Moshé, que rezou por misericórdia. D'us aceitou as rezas de Moshé e perdoou o povo. Porém, uma parte do povo acabou pagando muito caro pelo erro que havia cometido: os primogênitos.
A Torá dá muita importância para os primogênitos. No princípio, eles haviam sido honrados com o cargo de fazer todo o serviço Divino do Mishkan (Templo Móvel). Porém, quando eles participaram da transgressão do Bezerro de ouro, perderam seu nível espiritual diferenciado. É isto que o versículo da Parashá veio nos ensinar quando falou que D'us escolheu os Leviim no lugar dos primogênitos. O serviço espiritual do Mishkan, que originalmente havia sido dado aos primogênitos, foi retirado deles e passado para sempre para a tribo de Levi, que não participou do erro do Bezerro de ouro.
Mas se pararmos para refletir, qual foi o grande mérito da Tribo de Levi? Todo o grande “feito” deles foi não ter participado do Bezerro de ouro, isto é, simplesmente conseguiram evitar cair na transgressão de idolatria na qual seus irmãos caíram. Não foi nem mesmo um ato ativo, e sim algo passivo. A recompensa não parece desproporcional ao que eles fizeram?
Explica o livro Lekach Tov que o teste da tribo de Levi não foi assim tão simples. O desespero havia tomado conta do povo. A loucura de construir o Bezerro de ouro começou a se espalhar entre todas as pessoas, e começou a se tornar algo aceitável e até mesmo lógico. A pressão social era tremenda e a confusão pairava no ar. Nestas condições, era muito difícil não se deixar enganar. Um povo inteiro, que quarenta dias antes havia escutado os mandamentos diretamente da boca de D'us, acabou se deixando levar pelo desespero e pela confusão. Somente a tribo de Levi conseguiu se manter em suas convicções e, com isso, escapar do terrível pecado que quase destruiu o povo judeu. Por isso, meritaram receber o serviço Divino do Mishkan.
Daqui aprendemos algo muito importante para nossas vidas: aquele que consegue se manter forte em suas crenças e convicções, e que se esforça para manter sua claridade mesmo em épocas de confusão, mesmo quando a maioria do povo está seguindo caminhos incorretos, merita uma recompensa muito grande de D'us.
Infelizmente esta confusão e inversão de valores está acontecendo nos nossos dias. Escutamos as notícias do que ocorre no mundo inteiro e percebemos que há uma terrível e acelerada perda dos valores mais básicos. A sociedade começa a permitir e a aceitar o que antes ninguém ousava nem mesmo mencionar em público. Ao contrário, aqueles que não concordam são perseguidos e tachados de “extremistas”. A desonestidade parece ter se institucionalizado, tornando muito fácil cometer erros e simplesmente dizer “Mas qual o problema? Afinal, todos fazem isso!”. Somos influenciados pela sociedade e acabamos deixando que a confusão generalizada mude nossa forma de pensar. Neste ambiente, é muito importante lutar para mantermos nossa claridade, para não irmos atrás daqueles que, apesar de serem maioria, estão se desviando.
Logo após Moshé ter descido do Monte Sinai e ter visto o Bezerro que havia sido construído, ele foi instruído a castigar aqueles que haviam realmente feito idolatria e haviam incitado o resto do povo. Moshé então convocou todos aqueles que quisessem se voluntariar, e anunciou: “Quem está com D'us, venha comigo” (Shemot 32:26). Infelizmente apenas a tribo de Levi escutou o chamado de Moshé e se levantou para cumprir o que D'us havia comandado. Por isso a tribo de Levi recebeu o mérito, para sempre, de estar mais conectada com D'us e poder fazer os serviços religiosos.
Este anúncio de Moshé continua ecoando até os nossos dias. “Quem está com D'us, venha comigo”. Precisamos juntar todas as nossas forças para não nos deixar influenciar pelos conceitos equivocados. Não podemos ter vergonha de sermos uma minoria que discorda do que é incorreto e imoral. Não podemos nos acomodar e aceitar em silêncio que a verdade seja corrompida. E podemos fazer isto com a certeza e a tranquilidade de que os frutos de não ficarmos em silêncio serão para sempre, não apenas para nós, mas para todos os nossos descendentes.