Você casou, formou uma família e começou, depois de determinado tempo, ou logo que casou, ou até mesmo antes de casar, a descobrir o universo da Torá, sua beleza, a linda vida que ela promete, tanto neste mundo como no mundo vindouro. Você passou a conhecer famílias com fortes valores espirituais e se espelhou nelas para sua vida e a de sua família. Estudou que a vida tem um objetivo espiritual, e que sem esse objetivo, o ser humano vive uma vida vã e sem sentido. Ou seja, você descobriu que precisa da Torá muito mais do que precisa de ar ou de água, pois estes últimos proporcionam uma vida limitada, enquanto que a Torá proporciona vida eterna. Com tudo isso, sua determinação é forte e você não vê outra escolha para si a não ser o caminho da Torá. Não consegue conceber que seus filhos tenham outra educação, se não a educação da Torá. Mas eis que você se depara com um grande obstáculo: sua esposa ou seu marido não fizeram esta descoberta ou, se fizeram, não decidiram levar este caminho adiante. Ou, se decidiram, andam a passos muito mais lentos que os seus.
Este obstáculo parece não ser apenas um simples obstáculo, mas, obviamente, algo que impossibilita totalmente este seu objetivo espiritual. Mas saiba: ele aparece muitas vezes, em inúmeras famílias. Por que isso acontece? Mesmo que os dois concordassem, antes do casamento, com o nível de espiritualidade a ser aplicado dentro de casa, é certo que depois de casadas as pessoas acabam revendo seus valores, pois estão diante de novos desafios, passam a se conhecer melhor e, o que muitas vezes era importante antes, agora deixa de ser. E o que não era, passa a ser.
Obviamente que isto gera uma grande contradição na sua cabeça: como é possível? O que fazer? Não vou conseguir ter uma família no caminho da Torá… Mas para mim, esta possibilidade é totalmente inconcebível. Aparentemente, só restam duas alternativas:
Desistir dos seus sonhos espirituais e saber conviver com a frustração, ou lutar pelos seus sonhos e viver uma vida conjugal onde o conflito sempre estará latente, e as brigas sobre qual a maneira correta de se fazer isto ou aquilo sempre aparecerão.
No entanto, as duas alternativas são extremamente negativas e contradizem os princípios da Torá. A Torá não permite falta de harmonia entre o casal, e nem que o crescimento espiritual seja deixado de lado. Qual seria então o caminho correto?
A resposta é que nossa missão espiritual, aquilo que D’us quer de nós, não é necessariamente ser ou ter uma família igual à dos tsadikim que conhecemos ou ouvimos falar. A nossa missão especifica é outra. É saber lidar com a vida que D’us desenhou exclusivamente pra nós. Se tivermos um cônjuge menos religioso, é porque nossa missão é saber viver com uma pessoa assim, deixá-la feliz apesar das diferenças e, com tempo e sabedoria, dar espaço para o resto da família avançar espiritualmente.
Não se deve simplesmente buscar modelos fora de casa e tentar aplicá-los dentro dela, achando ser esta uma tarefa simples. Uma casa com alto grau de espiritualidade é o resultado de décadas, ou até gerações de esforços e superação, além de muitas rezas e lágrimas derramadas. Não dá para querer pular etapas e, de um dia para o outro, querer ter uma casa assim. O Gaon de Vilna relata que aquele que tenta pular etapas não encontra ajuda dos céus em sua empreitada*.
Também não se deve idealizar uma casa de Tsadikim como sendo um paraíso sobre a terra como se ali não houvesse problema algum. Em qualquer casa existem problemas de educação, de relacionamento, entre outros. Até mesmo na casa de Avraham e Sará isso existia. Por analogia, não se deve esperar que nossa casa seja um paraíso na terra, que nossos filhos tenham o comportamento de anjos e nosso cônjuge se comporte de maneira perfeita.
Em resumo, olhemos para dentro das nossas casas e não para a casa dos outros. O nosso principal foco deve ser o nosso cônjuge, o complexo universo humano que há dentro dele. Devemos compreender e aceitar as angústias, sentimentos e vontades dele. Deixar claro que gostamos dele do jeito que ele é. Essa é a primeira etapa, o início da construção de uma família de Tsadikim. Muitos não sabem, mas o amor entre homem e mulher é a base de toda a vida judaica, vem antes de qualquer outra coisa. E esse amor deve ser totalmente incondicional, independente de se o cônjuge observa ou não observa a Torá.
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